Jesus, contudo, em diversas passagens anuncia que a disposição de perdoar os outros deve partir do sujeito ofendido (MT. 6:12-14; 18:21s; Lc 11:4). Ocorre nessa perspectiva uma mudança fundamental na compreensão do ato de perdoar: deixa de ser algo a ser dado por merecimento e torna-se uma expressão de misericórdia. A misericórdia é justamente o contrário do merecimento: é dar sem merecer.
A misericórdia leva em conta os atos praticados e a condição do pecador. Contudo, esses elementos não estão em primeiro plano. O que move a misericórdia é anseio de ver o indivíduo que está afastado novamente presente na comunidade. Além disso, a misericórdia é uma atitude exercida por Deus, e serve como medida para a ação humana (Lc. 6:36).
Cabe acrescentar ainda a misericórdia como sendo o extremo oposta da ira. A ira é movida pela idéia de “justiça retributiva” e reclama pela condenação dos culpados. Por sua vez, a misericórdia se caracteriza pela disposição de empregar todos os meios, tempo e forças para salvar. Por isso, um elemento essencial da misericórdia é a aceitação do outro, o exercício do amor incondicional.
A atitude misericordiosa gera na pessoa alvo do perdão uma atitude de gratidão. Enquanto que na ótica meritória o indivíduo pode exigir o perdão após ter atendido todas as prescrições, aquele que é alvo de misericórdia nada pode a não ser aceitar ou rejeitar a oferta. Aceitando o perdão, assume que é menor frente aquele que o perdoou, o que marca assim a humilhação e prestação de honras.
E aquele que perdoou não se considera de maneira alguma superior ao seu ofensor, pois, ao aceitá-lo, abre mão do direito de “cobrar a dívida” e eleva o outro a condição de igualdade.
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