8.11.07
Corpo morto, escrito com palavras sem propósito
Meu propósito em criar um blog nunca foi ter um diário virtual, mesmo estando ciente de que cada palavra escrita carrega um retalho de mim e me despe um pouco mais. Não tenho o blog por terapia, ou porque sou viciado em escrita, ou porque desejo me tornar conhecido e deixar-me conhecer. Até posso ter afirmado isso algumas vezes, mas na real desconheço a principal motivação. Se em alguns textos escrevi abertamente sobre a minha vida era apenas com intuito de refletir sobre algum aspecto da existência; o que confesso ter feito de modo muito piegas. Se algum dia esse blog teve algum propósito, hoje ele se perdeu. Desconheço esse espaço. Desconheço-me nos sentidos dessas palavras. Vejo meu reflexo disforme, as linhas retas não representam com exatidão a tortuosidade do meu ser, o encadeamento lógico das idéias mascaram o meu ceticismo quanto a tudo e todos, a doçura de muitas palavras não estão de acordo com amargo sabor da vida em meus lábios e, a beleza tantas vezes dita é apenas a quimera de sonhos inexistentes. Se algum dia essas palavras tiveram algum propósito para serem aqui tecidas, ele se perdeu entre as linhas que erigiram um mito sobre mim. Sinto-me como um personagem construído: um divorciado de 38 anos que trabalha há 15 numa empresa onde arranjou um conchavo e lá ficou, às quintas e sextas sai com os amigos pra tomarem um chopp, joga futebol nas quartas, tem dois filhos e é adorado por todas as secretárias, acha que já passou por inúmeras coisas nessa vida e, com certeza, ele leu os livros errados, adora assistir TV, é tão bonito quanto imaturo, lê Minutos de Sabedoria, canastrão e é medíocre, sem demais ambições, é um homem totalmente comum iludido de que é a mesma pessoa, que é adorado da mesma forma que era no segundo grau. Se algum dia teve algum propósito, se perdeu na decadência da minha da vida nos últimos dois anos. Decadência não revelada aqui, pois não era esse o propósito e pela força do mito que aqui impera. Sou um decadente, perdido em devaneios nascidos de lugar algum e afogados em qualquer poça d'água. O mito robusto esconde a intemperança da minha pessoa, a instabilidade dos meus sentimentos, a ira e revolta contra minha postura diante da inexistente vida, a imoralidade devassa dos meus valores, a falta de indentidade que permite mitos serem escritos sobre meu corpo. Meu corpo morto, escrito com palavras incoerentes e dando origem a textos sem coesão. Poesia de rimas pobres, descrição superficial, dissertação mal fundamentada, ensaios sem criatividade, contos sem fantasia, romances desumanos, narrativas sem transformações. Corpo morto por ser escrito com palavras sem propósito; se algum dia ele realmente existiu.
 
posted by rafael at 22:30 | Permalink |


4 Comments:


At 09 novembro, 2007 03:03, Blogger Sandra Leite

Este comentário foi removido pelo autor.

 

At 09 novembro, 2007 03:05, Blogger Sandra Leite

Rafael,

Essas peregrinações que você faz no seu entorno e na sua alma, tornam ainda mais indecifráveis as inúmeras e múltiplas possibilidades de encontrar a cada dia um Rafael diferente.
Você é seu desafio constante e essas linhas, traço a traço, às vezes tão cheias , outras sem graça, fazem o espetáculo de SER quem você É!
E pra você eu deixo um poeminha q adoro, de um certo moço ....um tal de Mário Quintana!!!:)

O AUTO-RETRATO

"No retrato que me faço
- traço a traço -
às vezes me pinto nuvem,
às vezes me pinto árvore...

às vezes me pinto coisas
de que nem há mais lembrança...
ou coisas que não existem
mas que um dia existirão...

e, desta lida, em que busco
- pouco a pouco -
minha eterna semelhança,

no final, que restará?
Um desenho de criança...
Terminado por um louco!"



Double F, you are the Best!
beijokas

 

At 09 novembro, 2007 21:29, Blogger a calma alma má

Você precisa se ver com os olhos de quem está te vendo, te lendo...
Tanta revolta quanto à forma e eu volto aqui pelo conteúdo.
Aposto que não sou a única.
Beijos

 

At 11 novembro, 2007 23:41, Anonymous Anônimo

Ok. Vou me despir em comentários também.

Andei pensando no tema do teu post. Há algum tempo vejo que já não atualizo o Usina com tanta freqüencia nem sagacidade. Acho que ando dosando também o que escrevo. Tentando me mostrar menos nos posts e, na verdade, não vejo sentido nisso. Em ter um blog que não assuma sua personalidade, sabe? Tá complicado. Ando um pouco na concha, escrevendo e deletando, escrevendo e deletando. Cansei de deletar. Por isso penso duas vezes antes de escrever. Enfim. Talvez seja hora de repensar o motivo de ter um blog. Diário virtual certamente não é. mas então... me perdi.

Bj, Rafa!
Saí de trás da porta ; )

 


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