A tempos atrás postei um texto intitulado "quero ser um idiota". Hoje, lendo "Sidarta", de Hermann Hesse, deparei-me com um pensamento amigo e mais belo a minha opinião expressa naquela pequena reflexão.
Certa feita, quando a fisionomia do rapaz (seu filho) lhe recordava mais do que nunca a de Kamala, Sidarta lembrou-se subitamente de uma frase que ela lhe dissera, havia muito, nos dias da sua mocidade: "Tu não saber amar" - afirmara ela, e Sidarta lhe dera razão. Então se comparava a si com um astro e qualificara todos os homens tolos de folhas mortas. E, todavia, sentira que aquela frase continha um que de censura. Realmente, nunca lhe fora possível abandonar-se, entregar-se por inteiro a outra criatura, a ponto de esquecer-se de si mesmo e de cometer bobagens por amor de outrem. Nunca, nunca pudera agir desse forma e como lhe parecia naquele instante, era essa a grande diferença que o apartava dos homens tolos. Mas, desde que surgira o filho, também ele, Sidarta, transformara-se num homem tolo, que sofria por causa de outra pessoa, que se agarrava a um ente querido, que andava perdido de amor, que, devido a essa afeição, se convertera num imbecil. A essa altura, acometia-o, embora tardiamente, pela primeira vez na vida, aquela paixão, a mais forte, a mais estranha de todas, fazendo-o sofrer, sofrer miseramente e, mesmo assim, deixando-o sumamente feliz, dando-lhe a impressão de estar renovado e enriquecido.
(Hermann Hesse. Sidarta. Civilização Brasileira, 1971.)
Reforço, agora junto com Hesse, o meu desejo de ser um tolo, um imbecil - um idiota.
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