Dera conta do inverno quando a primeira lufa gélida do vento rasgou sua pele. Dera conta do seu inverno quando o ar dos pulmões exalado pela boca rachada não branqueou como ocorre no encontro do quente com o frio. Percebeu a primavera artificial na qual vivera durante os vinte e quatro invernos desconhecidos, inverno confinado dentro de si, assim como até então havia permanecido no local do confinamento das gentes, longe do horizonte infinito. Descobriu o infinito horizonte de si, e temeu - reconheceu seu verdadeiro lar.
Da lufa cortante e do horizonte temeroso desviara o olhar, já perdido na infinitude de si e do mundo. Saíra do confinamento das gentes no qual encontrara-se sempre achado. Foi quando achado que descobrira-se no confinamento. No olhar perdido no infinito do horizonte de si e do mundo, revelou-se o verdadeiro local de sua morada: na falta. Entendeu porque se sentira confinado quando feliz – a felicidade é estar na presença do desejado, é o fim do desejo. Sua infinitude estava na dor, na ausência do desejado, na eterna permanência do desejo.
No vigésimo quarto inverno de uma vida nunca primaveril, encontrou seu lar na inexistência dele, na ausência de um lugar para posar seus olhos, na presença do cortante vento gélido do qual se deseja sempre sair, na dor da infelicidade para nunca se encontrar confinado. Para além da janela encontrou seu lar, no horizonte infinito, na presença da ausência. Seu lar estava na falta – na sofrega presença do desejo.
Descobrira-se no vigésimo quarto inverno, na contemplação pela janela do temeroso horizonte e na permanência da falta.
(Falta: a tua ausência presente)