Talvez aconteça apenas comigo. Ao ouvir uma verdade afirmando algo que eu não gostaria de saber, sempre tenho a sensação de estar levando um soco. Parece que ela me deixa atordoado, sem noção de tempo e espaço. Nenhuma palavra aparece para socorrer-me, restando apenas o silêncio constrangedor denunciando a minha derrota e conseqüente concordância. Em algumas ocasiões, quando a humildade resolve dar as caras, acontece de eu dizer: "Tem razão"; "você está certo". Contudo, mesmo essas palavras são ditas após um período de recuperação do nocaute sofrido.
Todavia, ultimamente tenho a impressão de não existir nada pior do que a verdade não dita: uma verdade descoberta.
Disse anteriormente que a verdade dita vem como um soco, de supetão. A verdade não dita, mas descoberta, aparece aos poucos. Mas esse "aos poucos" não entendo como doses homeopáticas; ao contrário. Vejo como uma ferrugem que aos poucos corrói toda uma estrutura, condenando-a para sempre. Como cupins que trabalham no interior da madeira, deixando por fora a impressão de estar tudo em perfeito estado.
Por que a verdade descoberta causa tanto mal? Porque ela dá margem para continuarmos acreditando que pode não ser verdade. Acaba gerando uma esperança de ser tudo apenas um engano, e no fim saberemos estar certo.
Poderia ser dito que a verdade descoberta é melhor pois é acompanhada por uma fase de amadurecimento, enquanto que a verdade dita pode causar danos irreversíveis devido ao impacto causado. Não sei. Concordo que a verdade dita é muito dura. Contudo, a verdade descoberta é perniciosa, pelo fato dela alimentar a desconfiança.
Esse é o ponto em que a verdade descoberta se apóia: na desconfiança. Parte-se em busca da verdade porque desconfiou-se de algo em algum momento. E a verdade nada mais é do que uma recuperação da confiança perdida. Confesso aqui um pessimismo: a confiança perdida jamais é recuperada.
Por sua vez, a verdade dita tem como ponto de apoio a confiança. Quando se diz a verdade é porque confia-se que será recebida como algo bom. Quando se ouve a verdade, confia-se de que foi dita como algo bom. Mesmo se quando dita ou ouvida, suas conseqüencias sejam catastróficas.
Se a verdade precisa ser descoberta, é porque ela teve algum motivo para ser escondida. E existiria um bom motivo em esconder a verdade?
Se a verdade é dita, é porque ela tem algum motivo para ser revelada. E existiria um mal motivo em dizer a verdade?
Para quem pensa existir bons motivos para esconder a verdade, é bom torcer para nunca surgir uma desconfiança que motive uma busca pela verdade dessa verdade. Pois uma verdade descoberta, arruína com toda a confiança existente.
Para quem pensa existir mal motivo em dizer a verdade, saiba que quando a verdade é dita, quem a diz se torna nú diante de quem a ouve. Pois uma verdade dita, revela toda a franqueza daquele que diz, e seu apreço por aquele que ouve.
Ouvir uma verdade pode ser doído.
Descobrir uma verdade pode ser mortífero.
Dizer uma verdade pode ser bruto.
Esconder uma verdade pode ser pernicioso.
Talvez a nossa relação com a verdade dependa da verdade da nossa relação com o outro. Quanto mais verdadeira seja nossa relação com o outro, menos medo de ouvir e dizer a verdade teremos...
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