29.5.07
caminhos de vida ou morte
Por anos carrego a impressão de que a maior parte das pessoas não são felizes. Digo isso independente do conceito de felicidade pensado (Sim, existem várias opiniões sobre a tal de felicidade). Grande parte das pessoas vive. Ou melhor, sobrevive. Faz força para viver. Luta para viver. Mas não é uma luta pela vida, em favor da vida, com fins a prolongá-la. Não. É uma luta para simplesmente viver. É uma luta para não sentir que se deixou morrer. Uma luta para não sentir-se responsável pela própria morte.

A sobre-vida conquistada por estes sobreviventes, para mim não passa de um joguete com a vida, a fim de ludibriá-la para culpá-la da desgraça da sua existência. Este tipo de sobrevivente muitas vezes também é ingrato com a querida morte, pois a culpa de ter demorado para vim buscá-lo. "Benza deus" - deve pensar a dona morte - "agora quem aguentará esse 'peso morto' (literalmente) sou eu e não mais a vida".

Essa atitude é típica de alguém desinteressado pela vida, e quando a morte vem, reclama por não querer morrer. Afinal, como um sujeito pode não querer viver e não querer morrer ao mesmo tempo?

Certa vez já disse que a vida é longa demais. Por isso sempre adiamos a tarefa de viver para o dia seguinte. Quando a morte chega, descobre-se não haver mais dia seguinte, pois dias seguintes existem em número limitado. E quando as pessoas vão adiando o viver para o dia-de-amanhã, não percebem que estão morrendo, porque morrer é não-viver.

Morrer é não-viver.
Quem sobrevive não vive, morre.

Tais pessoas parecem andar mais em caminhos de morte do que de vida. Adiam tanto a tarefa de viver que no final descobrem não ter vivido nada. Ora, quem não viveu nada foi porque não estava vivo, e quem não está vivo...

Se há quem adia demais, existe também aquele que vive tudo de uma vez. Acha que a morte pode chegar a qualquer momento roubando-lhe a vida. Por isso é preciso viver o quanto antes, o mais intensamente, pois a morte pode estar a porta. O fim da vida pode ser agora! Mas o "qualquer momento" da morte pode demorar anos, ela pode não estar a "porta" e a vida nem esteja "pensando" em acabar.

Viver "tudo" é o mesmo que viver "nada". Se temos tudo, o que resta para desejar? Se fizemos tudo, o que haveremos de fazer? Se vivemos tudo, o que há para viver? Quem quer viver tudo de uma vez também parece andar nos caminhos da morte e não da vida. Vive tão desesperadamente que perde a esperança de viver. E quem não tem esperança em viver...

Enquanto uns estão mortos por adiarem a hora de viver, outros abreviam a hora de morrer por não esperarem (no sentido de esperança) viver amanhã. Uns estão mortos porque viveram muito; outros por não viverem nada.

Morte não é apenas o fim da existência. Pode ser também a nossa atitude frente a tarefa de viver. Pode caracterizar o caminho pelo qual resolvemos explorar a vida. Viver é verbo no infinitivo; verbo é ação; infinitivo exprime indeterminação temporal. Quando não se tem um determinado tempo para agir, todo tempo é tempo. Quando não determinamos tempo para viver, todo tempo é tempo de viver. Quando determinamos tempo para viver, sobrevivemos; e sobreviver é não-viver: é morrer.

Caminhamos em direção à morte. Não adianta querer trocar a passagem de destino: todos desceremos na estação em que a temida senhora nos espera. Contudo, podemos decidir quanto ao caminho que trilharemos e na companhia de quem iremos. Podemos convidar desde o ínicio a senhora morte para ser nossa acompanhante, viajando com as cortinas fechadas e não descendo nas várias estações existentes no trajeto. Ou também podemos ser agraciados com a companhia da vida, ouvindo suas histórias tristes e alegres, belas e medonhas, e ao nos desperdir dela na última estação, não partir com tristeza, mas com um sorriso de satisfação nos lábios e um brilho de encanto no olhar.

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posted by rafael at 18:15 | Permalink |


2 Comments:


At 31 maio, 2007 00:18, Blogger Thiane

Que tema denso. Mas é verdade, as pessoas hoje são mais infelizes que felizes. E elas simplesmente não sabem a razão de tanta infelicidade. Bjs

 

At 02 junho, 2007 17:08, Blogger Menina Malvada (Ou Kaka)

A morte é consequência da vida e empurrar a vida com a barriga é o que todo mundo faz! As pessoas não são felizes simplesmente pelo fato de serem gananciosas, quando muito se tem, mais se quer e a busca da felicidade é isso, ter tudo que se quer. Não falo somente de bens materiais, mas de sentimentos, a verdade... Ninguém atinge a plenitude, por isso o "ser" é tão infeliz, ele sabe simplesmente que a sua busca sempre terá o mesmo fim: a morte.
A morte é a consequência E a sequência da vida.
Simples!

 


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